red bull no teto do mundo - te dá asas...

red bull no teto do mundo - te dá asas...
umich.edu

ब्रुना सोअल्हेइरो

Rio de Janeiro, RJ, Brazil

domingo, 16 de março de 2008

Desinformação II

Foi com grande frustração que acompanhei a entrevista do prof. Williams Gonçalves no jornal das dez, da globonews ontem, dia quinze de março. Acabei enviando um email pro dito professor, que reproduzo aqui. (Peço desculpas pelo tamanho).

"O senhor com certeza sabe que as atuais manifestações deflagradas (já que o termo "orquestradas" pode dar um tom pejorativo) em todo mundo desde o dia 10 de março deste ano (principalmente) pouco têm de "ambíguas" ou "confusas": dizem respeito ao 49º aniversário do exílio do Dalai-Lama, líder religiosos e político do Tibet - e não o "sumo-pontífice da religião budista". O senhor tem mesmo dúvidas quanto a "clareza" das manifestações, professor?
É importante lembrar também que os manifestantes questionam as atitudes do governo chinês quanto ao respeito aos direitos humanos na Região Autônoma do Tibet, a qual, conforme o senhor mesmo explicou, deveria ser livre para manter sua tradição cultural e religiosa. (O governo chinês "respeita as peculiaridades culturais e religiosas", em suas palavras). Deveria. Já faz algum tempo que a imprensa internacional procura divulgar, com grande dificuldade, que um número considerável de templos budistas vem sendo destruído. Isso sem levarmos em conta a dificuldade que um turista ocidental tem para, por exemplo, visitar o Palácio de Potala, em Lhasa, devido principalmente aos impedimentos da burocracia chinesa. Mas o acesso de turistas ocidentais a um dos maiores centros difusores da tradição budista não chega a ser uma questão, não é mesmo?
Talvez uma das maiores dificuldades de nosso ofício - o senhor, como eu, também formou-se em História pela Universidade Federal Fluminense, não? - acredito eu, seja não cair na tentação das frases definitivas, nas quais os termos "nunca", "jamais" ou até mesmo "sempre" fazem-se presente. Ora, professor, como o senhor explica a frase "O Tibet nunca foi independente?". Um historiador da "História Antiga do Tibet", que não é o meu caso e não parece ser o do senhor, poderia nos levantar a seguinte questão: no século VIII não era a "China" - ou uma parte do que viríamos a chamar de China - que pagava tributos ao "Rei do Tibet"? Lá pelo ano de 763, professor, que exército invadiu que região?
Francamente. Seríamos insanos de trazermos esta discussão para a antiguidade, esse período distante no qual não podemos nos esconder atrás dos nacionalismos e dos Estados-nação para justificarmos nossas análises históricas? Claro que não faríamos isso, não é? Quem sabe, então, devêssemos voltar ao século XVII, quando se davam os primeiros contatos entre europeus e tibetanos - muito antes dos ingleses, não? - e o V Dalai-Lama - o "sumo-pontífice do budismo" - apenas aguardava a chance de governar um "país". Sim, é verdade, o Tibet, que nunca fora independente, teve até Rei antes que os Dalai-Lamas concentrassem o poder civil e religioso. Mas, no final do século XIX, os ingleses já estavam lá...
Então, no século XX os chineses "voltaram a integrar a região". Voltaram? Desde o século XIII o Tibet é chinês? O curioso é olhar os mapas dos séculos XVII e XVIII e não conseguir achar Lhasa dentro da China... Afinal, o que é "China"? e o que é "Tibet"?
Isso eu não saberia dizer, professor. Mas sei que, para um historiador, é muito complicado afirmar que por estar a 4 mil metros do nível do mar "impossibilita a região de ter uma vida econômica normal." Eu fico imaginando, então, o que comem e o que vestem todos aqueles monjes há alguns séculos. E também não sei dizer por que, então, alguns historiadores defendem a importância da região para as antigas rotas comerciais locais (Índia-China) da época moderna. Menos ainda saberia explicar, então, qual o interesse da China nesta região fadada à aridez do teto do mundo.
O curioso é que eu andei lendo que as terras tibetanas produzem uma quantidade considerável de uma espécie de farinha, chamada tsampa, e que é fundamental para a dieta local. Mas eu, pessoalmente, não poderia ter certeza, pois ainda não pude visitar o Tibet, com medo da burocracia chinesa (suas senhas e seus tickets de trem distribuídos "democraticamente") para com turistas ocidentais. De qualquer forma, nenhum país sério vive à base de farinha. Imagina as populações nômades do Tibet, não é?
"Economicamente, o Tibet sempre dependerá de algum outro Estado, de alguma outra economia." Eu fico feliz que ninguém tenha dito isso à Holanda em sua "formação". Afinal, como é possível que um país seja construído abaixo do nível do mar? será mais simples ou mais complicado do que plantar a 4 mil metros de altitude? Talvez devamos perguntar aos japoneses, que estão muito bem "se virando" com a dieta milenar a base de peixe cru. Ou à Israel que há alguns anos resolveu plantar no deserto.
Como é possível, professor, para um historiador, ter certeza de tudo isso? Eu, modestamente, acho que não podemos ter certeza. E mesmo não sendo nem tibetana nem budista, não posso deixar de ficar entristecida quando ouço declarações como as suas em veículos de informação com o alcance do jornal das dez da globonews. Chego a ter dúvidas quanto ao papel dos "intelectuais" no mundo contemporâneo. Mas recupero logo o fôlego, professor, porque são estas dúvidas que me motivam a estudar, e com estas dúvidas fico longe dos "nunca", "jamais" e "sempre".
Bruna

Um comentário:

Ana Lobato disse...

o que ele respondeu??